Entrevista com Zeina Latif, palestrante no 12º Encontro de Previdência Complementar Região Sul
Confira nossa entrevista exclusiva com uma das principais atrações que estarão presentes, nos dias 17 e 18 de maio, no 12º Encontro de Previdência Complementar Região Sul, com organização da Tchê Previdência. O encontro será totalmente online e você pode fazer sua inscrição clicando aqui.
Zeina Latif é doutora em Economia pela USP e eleita a economista mais influente pela Revista Forbes. Passou por várias instituições financeiras, tendo sido economista-chefe da XP. Escreve colunas semanais para o Jornal Estadão. É autora do livro “Nós do Brasil”.
Espia só o bate-papo:
Nosso evento trata de superação em cenários desafiadores, o cenário para 2022, é de mais oportunidades ou desafios?
No Brasil com ciclo econômico tão acidentado, um país com baixo potencial de crescimento, o que faz a economia mais sensível nos choques econômicos, oportunidades e desafios sempre andam juntos. No Brasil essas coisas sempre têm que ter em mente, por um lado, saber o momento de aproveitar as oportunidades, mas por outro lado, o outro pé se equilibrar na boa gestão com alguma dose de cautela, para que não gere e promova riscos excessivos nas tomadas de decisão. Então, o Brasil é sempre o país onde você tem que equilibrar essas duas coisas, não fazer nada se você corre o risco de, às vezes, perder movimentos importantes de mercado, mas por outro lado você tem que ter pé no chão que hoje o mundo é mais complexo.
O quadro brasileiro também eleva o tamanho do desafio, não vejo 2022 com um ano de cenários tão negativos. Claro, é um quadro praticamente recessivo, acho que a gente corre o risco sim de ter uma avaliação negativa do PIB, vai demorar até que o Banco Central consiga trazer a inflação pra baixo. É claro que não é um ambiente macroeconômico confortável, mas eu acho que também não é o quadro que a gente fala assim: “Olha, isso aqui é só o início de uma fase ruim”. Não é isso também, são movimentos que eles têm um momento de maturação, não acho que a gente está no início de uma coisa muito ruim, acho que a gente está em uma fase difícil, que já não é novidade. Atividade fraca e inflação alta por um período grande.
O quadro internacional, eu não acho que ele é um fator tão preocupante assim no momento. Em relação às eleições, geralmente os investidores dão benefício da dúvida para os candidatos e os próprios candidatos têm incentivo para ter um discurso mais cauteloso. Principalmente indo para o segundo turno. Então, essa visão de grandes volatilidades, tem que tomar um pouco de cuidado. Quando a gente olha preços de ativos no Brasil em época de eleição, eles não tiveram um comportamento tão descolado assim do que seria esperado da área internacional, claro, levando em consideração que as volatilidades aqui são altas. Então, eu não acho que 2022 é aquele ano que para tudo, porque o grau de incerteza não dá pra fazer nada.
O mercado local pode ser impactado de forma mais significativa pelo cenário internacional de guerra e movimentos pós pandemia?
Em relação ao conflito da Ucrânia, o grau de incerteza sobre a duração da guerra, em relação à qual será realmente o desfecho. O impacto disso na relação China e Estados Unidos que pode recrudescer o antagonismo. O fato de provavelmente as sanções contra Rússia serem mantidas depois da guerra, ou seja, são muitas variáveis que tornam o ambiente incerto, ao mesmo tempo em que é difícil precificar. É tudo muito novo, tudo muito imponderável. O mercado de certa forma tem reagido com uma certa tranquilidade, não é uma volatilidade elevada, isso que a gente está vivendo agora é muito em função da dificuldade de precificar esses eventos, dado o grau de incerteza. Então, vale colocar que não devemos tomar essa relativa calmaria dos mercados, lá fora inclusive, como certeza que as coisas estão bem equacionadas, ou que estarão bem equacionadas. De tempos em tempos estaremos sujeitos a eventos geopolíticos e fontes de volatilidade.
Não tornar esse período atual como fonte de sinalização para o futuro, mas de qualquer forma hoje esse é o retrato. E o Brasil assim como outros da América Latina está numa posição relativamente positiva, ou seja, de sofrer menos esse impacto e em alguns aspectos ser beneficiado, ironicamente, do conflito. Sim, do lado negativo tem inflação mais resistente que pode levar o Banco Central a ter que subir mais os juros, não muito mais, porque tem pressões externas em que a tendência do Banco Central é não usar os juros para combater a inflação, por exemplo, na questão dos fertilizantes que machuca nossa agropecuária. Então, é claro que tem essas notícias negativas, mas por outro lado tem ganhado a possibilidade de ampliação de alguns mercados do Brasil, por exemplo, carnes, milhos e tem algo também interessante que está acontecendo. O investidor internacional passa a olhar a América Latina com outros olhos, uma vez que não tem envolvimento no conflito, não tem risco de eventos geopolíticos na região, tem essas blindagens.
Então, para o investidor global, investir na Europa, ou mesmo na Ásia, isso tem sido visto como um risco que não se quer correr e que vale a pena olhar a América Latina e o Brasil. Isso explica a mudança de humor mesmo com o baixo crescimento da região, mesmo com o isolamento da região. Hoje se tem uma visão um pouco mais benigna, então por esse aspecto, juntando tudo isso, não dá pra gente dizer que a questão do conflito, embora possa trazer volatilidade de tempos em tempos, não dá pra gente dizer que seja um evento que esteja indo para campo o negativo, de fato gerando um ganho negativo muito claro para o Brasil. Claro, vamos ver a capacidade do país de se posicionar para atrair investimentos, fazer a lição de casa para atrair investimentos.
As EFPC’s representam parcela importante do mercado de investimentos, como este segmento pode ser impactado pelo cenário eleitoral?
Eu não vejo o cenário eleitoral, como eu coloquei, como fonte de volatilidade tão grande assim. Os agentes econômicos tendem a dar o benefício da dúvida, é uma forma de olhar para o comportamento do Real contra dólar comparativamente a uma ampla cesta de moedas. Claro, que controlado pelo fato da nossa moeda ser naturalmente mais variável. Então, feito esse controle, o que a gente observa é que em anos de eleição o real e o dólar não descolaram tanto assim. Aliás, não descolaram daquilo que se esperava do cenário internacional, isso é uma forma de ver que os mercados têm sim o benefício da dúvida, como eu já coloquei. Os próprios candidatos, para capturar o apoio do eleitor mediano, que tem perfil mais conservador na economia, também tendem a ter um discurso mais responsável, principalmente indo para segundo turno. Então não vejo isso como uma fonte de volatilidade, o fato é que nós temos potenciais ali em tempos de correção em função de uma incerteza.
A ordem, o mundo está mais complexo, vamos dizer assim, então eu acredito que é um cenário, mas que não é um cenário negativo. Ou seja, você vai se posicionar para um cenário negativo? Não. Ainda que tenha um quadro de inflação no país, de alguma forma isso já está precificado. Por um outro lado, você não vai ter um posicionamento para um cenário super benigno, em um quadro econômico frágil. Fazer um posicionamento benigno de forma consistente precisaria ter mais elementos sobre o que vai ser o próximo governo. Então, eu diria que não é uma gestão de tão bom aspecto, tem que ficar apenas cautelosa em relação a possíveis eventos de fora e de dentro, mas eu não vejo aqui espaço para posicionamento muito ativo de fora de forma mais duradoura. Essa disciplina que de quem está na linha de frente é muito importante.